06/09/2021 - 10h58
O nosso amor a gente inventa
Nenhum casamento ou relação profissional se rompe apenas pelo episódio de ontem, avisa Marcelo Madarász
Por Marcelo Madarász*
A maioria de nós conhece alguém que está num casamento ou numa relação que, aos nossos olhos e da grande maioria das pessoas, seria considerada tóxica, inadequada, que muitas vezes faz muito mais mal do que bem aos envolvidos. E a pessoa ou não percebe, não se dá conta ou, apesar de perceber, faz uma escolha por permanecer na situação, apesar de todos os danos, muitas vezes graves, que aquilo lhe traz.
Sem entrar na seara do julgamento, mas na tentativa de compreensão, há a necessidade de conhecer a história dessa pessoa, sua infância, suas dificuldades, a formação de suas crenças, que, muitas vezes, são limitantes, sua identidade, seu conjunto de valores, como ela superou ou não seus obstáculos, como formou vínculos, a relação com o pai e a mãe ou quem fez esses papéis, etc. É também pela necessidade de aprofundamento nesses temas que os processos terapêuticos são tão importantes.
Transpondo esse cenário para o mundo das organizações – já que as pessoas são uma só e tanto faz se as estamos observando no ambiente pessoal ou profissional –, há muitas pessoas que também “inventam” um cenário profissional ilusório no qual passam a acreditar, muitas vezes até para sobreviver ou suportar determinados ambientes ou situações, da mesma forma que, por medo de ficar só, por problemas de autoestima ou por questões várias, a pessoa permanece naquele casamento tóxico.
Muitas vezes, há uma dinâmica muito ruim no ambiente de trabalho, chegando a causar sofrimentos grandes, que podem ou não (na maioria das vezes é o que acontece) desencadear uma patologia. E a pessoa, por não ter consciência ou por ter muito medo, escolhe permanecer naquela empresa, apesar do sofrimento que isso causa.
O preço dessa escolha pode ser bem alto e os prejuízos, além de incalculáveis, irreversíveis. Há de se tomar cuidado para não cairmos no famoso triângulo do drama, no qual há vítimas, perseguidores e salvadores. Aquele que faz a escolha, por vezes inadequada, não pode ser visto como uma vítima indefesa do sistema vilão.
As pessoas acabam entrando em dinâmicas, nem sempre conscientes de que estão fazendo isso e, quando se dão conta, o diagnóstico de burnout já está fechado. O que faz a água transbordar do copo não é a última gota, mas todas as pequenas gotas que foram sendo colocadas ao longo do tempo. Nenhum casamento ou relação profissional se rompe apenas pelo episódio de ontem, trata-se de um processo.
Quantas vezes os sinais são dados e as pessoas simplesmente os ignoram? A síndrome de segunda-feira pode ser um dos sinais. Se a cada segunda você sofre e o seu corpo reage com algum mal-estar ou indisposição, há claramente um sinal de que algo precisa ser observado com mais atenção.
Pagamos contas e não é por essa constatação de mal-estar que devemos chutar o pau da barraca, desistir de tudo. Até porque isso iria à contramão do que normalmente seria necessário. A mensagem aqui é: mergulhe profundamente no autoconhecimento, tenha clareza de suas dinâmicas internas, separe o que é seu e o que é do outro e, da forma mais honesta possível, responda se essa determinada situação causa mais bem ou mais mal. Se repetidamente a resposta é que está te fazendo mais mal, está na hora de fazer algo por você e decidir se há a necessidade de ruptura radical ou algo mais leve já ajudaria. O importante é confiar em você e vencer os medos!
*Marcelo Madarász é diretor de RH para América Latina da Parker Hannifin
Foto de abertura: Marcos Suguio