
25/02/2025 - 15h51
RIP ESG: o contexto do possível retorno à moderação
Quando aplicados com razoabilidade, os critérios ESG são necessários no combate às ameaças globais
Por Gabriela Alves Guimarães e Juliana Ferreira Villaça*
Nos últimos anos, o termo ESG – Environmental, Social, and Governance (Ambiental, Social e Governança) tornou-se sinônimo de responsabilidade corporativa, sustentabilidade e investimento consciente, tendo sido, muitas vezes, alegado como um propulsor da lucratividade das empresas. Nesse contexto, grandes instituições financeiras incorporaram esses princípios em suas estratégias, por exemplo, pela promoção de metas como descarbonização e inclusão social, e afirmação, em seus relatórios, que os retornos financeiros estão atrelados a práticas empresariais que tem um impacto positivo.
No entanto, a tríade, antes vista como uma vantagem competitiva e essencial à atração de investimento e retenção de clientes, tem enfrentado resistências e críticas crescentes, o que tem alarmado ativistas e pessoas pertencentes a grupos minoritários, principalmente aquelas que alcançaram (como resultado de programas de cotas) cargos relevantes nas empresas ou ganharam voz por pertencerem a seleto (e, de certo modo, pretencioso) grupo wokista (conjunto de pessoas que se mostram conscientes da gravidade das injustiças sociais existentes).
Impulsionados por tensões políticas, econômicas e sociais, instituições financeiras e empresas multinacionais, que lideravam a agenda ESG, começaram a recuar em seus compromissos com a temática, agora, sob a alegação contraditória (mas possivelmente – em parte – verdadeira) de que tais práticas são incompatíveis com os retornos financeiros esperados ou pressionados por grupos contrários à ideia de “capitalismo verde” (também denominado de “capitalismo woke”).
Isso porque ganhou força a percepção de “falso moralismo” no termo – apelidado por alguns de “ESG washing” ou “greenwashing” –, haja vista a realidade nem sempre representar o registrado no papel, em campanhas, cartas e comentários públicos, isso sem desconsiderar, no que diz respeito ao mercado financeiro, que o investidor percebeu que a “roupagem do politicamente correto” fez com que muitas gestoras se afastassem do dever fiduciário de maximizar os retornos financeiros para os clientes.
O espaço midiático conquistado pela sigla ESG remota ao Fórum Econômico Mundial que aconteceu em Davos, no ano de 2020, tendo suas práticas sido “aceleradas” com a pandemia de covid-19. Exemplo disso foram alianças como a Net-Zero Banking Alliance (NZBA) e a Net Zero Asset Managers Initiative (NZAMi), que lideraram os esforços para alinhar o setor financeiro à transição para uma economia de baixo carbono.
Entretanto, em 2024 e início do presente ano, as preocupações ESG começaram a crepitar e grandes nomes como JPMorgan Chase, BlackRock e Goldman Sachs anunciaram sua saída dessas iniciativas, enquanto empresas como Walmart, John Deere, Harley-Davidson e McDonald’s o abandono de programas de diversidade, equidade e inclusão (DEI), pertencente ao pilar social de ESG. A principal justificativa foi a crescente pressão política, especialmente nos Estados Unidos, onde a politização das práticas ESG ganhou força e, no caso das políticas de DEI, uma decisão da Suprema Corte daquele país que proibiu a ação afirmativa em admissões para candidatos a universidades (no Brasil, a Lei do Crime Racial, nº 7.716/89, vem sendo preterida às práticas ESG, tendo o STJ, inclusive, em recente decisão, desvirtuado seu teor ao afastar injúria racial contra pessoa branca).
A diminuição acentuada do tema no mundo cultural e empresarial decorre também de suas contradições, da sua visão (muitas vezes) maniqueísta e dos seus impactos principalmente nas relações interpessoais (aspecto social do ESG), afinal, como parece já ter entendido a Corte norte-americana (quiçá o atual governo do país) não é possível combater desigualdades reais pela promoção de novas discriminações, muito menos pela defesa da censura em termos de liberdade de pensamento e expressão. Na mesma linha, não é possível alcançar bons resultados financeiros, a prosperidade empresarial, e atender aos interesses dos stakeholders, se aspectos como raça, cor ou orientação sexual se sobreporem à meritocracia, ao conhecimento e experiência que são essenciais à gestão efetiva, inovação e empreendedorismo.
Mas, ao contrário dos que muito acreditam, não é o fim da temática, apenas a transição do ESG radical para o moderado, afinal, mudanças climáticas continuam a ser uma realidade inescapável, assim como o tratamento e a mitigação de crises sociais.
O desafio, neste momento, é reforçar a mensagem de que os critérios ESG, quando aplicados com razoabilidade, não são um luxo ou uma ideologia, mas uma resposta necessária às ameaças globais que colocam em risco a estabilidade econômica, ambiental e social. Também, desmistificar a ideia de que um freio nas práticas ESG resultará no seu falecimento, em uma ameaça à sustentabilidade.
Ao final, o que se espera da transição entre o radical e o moderado é o acordar de um sono ideológico profundo que trouxe severas consequências às empresas e mesmo à sociedade, que o ciclo de reação exagerada e contrarreação possam levar ao progresso, permitindo equilibrar lucros e responsabilidades socioambientais.
*As advogadas Gabriela Alves Guimarães e Juliana Ferreira Villaça são, respectivamente, sócia e consultora GRC sênior da FourEthics Consultoria
Foto: Divulgação/FourEthics